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B Boas Práticas na Convivência com o Semiárido

Organização Comunitária
Fundo Rotativo

 

À esquerda, jovens da comunidade; à direita, estoque de forragem animal.

 

O que é?

Vamos conhecer a experiência de fundo rotativo adotado por um assentamento na Paraíba, e que foi usada como estratégia de empoderamento para as mulheres e jovens do local.

Através de um investimento para potencializar a atividade da caprinovinocultura, o assentamento criou um fundo rotativo para aumentar a quantidade de beneficiários/as, tendo como foco a distribuição das crias desses animais para mulheres e jovens, auxiliando-os na criação de seus rebanhos e promovendo a melhoria de renda desse público.

 

Onde aconteceu?

 

A Associação de Cooperação Agrícola dos Produtores Rurais do Assentamento Nova Esperança São Domingos I (Acaprane), fica localizada na cidade de Cubati, pertencente à microrregião do Seridó paraibano.

 

Como aconteceu?

O Assentamento Nova Esperança São Domingos I participou de projetos de fomentos ligados às atividades produtivas, como o P1+2 e P1MC, pela ASA1 ; assim como a construção das casas e Projeto Brasil Sem Miséria (PBSM), pelo Incra.

A associação contou com um projeto de fundo rotativo solidário de confecção de tela e de galinhas. Esse fundo foi originado com um grupo de quinze pessoas; cada uma contribuía com R$ 10,00 por mês e, assim, todo mês alguém era beneficiado. Foi dessa experiência que surgiu a necessidade de criar o fundo com as ovelhas.

 

Como implementar?

O Semiárido apresenta alguns problemas sociais e econômicos ligados à falta de água provocada por longos períodos de estiagem. Essa escassez dificulta a criação e desenvolvimento de rebanhos e pastagem, algo que poderia fortalecer a economia local gerando renda e emprego.

Aliado ao fator climático, a falta de informações sobre tecnologias sociais para a criação de ovinos dificultava o desenvolvimento socioeconômico local. Para diminuir essas dificuldades, o Governo do Estado da Paraíba, apoiado pelo Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA), criou o Projeto de Desenvolvimento Sustentável do Cariri, Seridó e Curimataú (Procase), que atende as demandas sociais e técnicas dessas regiões.

No ano de 2014 começou a divulgação do Procase e a realização de convites às associações já existentes na região, incluindo a Acaprane. No primeiro trimestre, ocorreram no Território do Seridó treze reuniões de sensibilização, envolvendo 25 parceiros. Buscou-se estimular as associações (entre elas a Acaprane) a construírem propostas de projetos produtivos, para submeter a edital.

Ainda em 2014 iniciou-se a mobilização social, diagnosticando-se necessidades, traçando-se metas e ajudando as comunidades na criação dos projetos produtivos, que seriam apresentados ao Procase. As propostas tinham a finalidade de serem aprovadas para buscar apoio econômico e técnico. Firmados, os convênios apresentariam duração prevista para 24 meses.

Máquina adquirida através de recursos FIDA e melhorou a segurança forrageira da comunidade.

 

As parcerias que fortaleceram a comunidade.

Construído o projeto produtivo, traçadas as metas, convênio firmado, o projeto foi iniciado.

A primeira atividade realizada foi em torno da mobilização para a constituição da comissão de licitação, formada por membros associados, teve a finalidade de adquirir os equipamentos. O maior desafio nessa etapa foi preparar a equipe: os membros não tinham intimidade com processos burocráticos, mas, como resultado das capacitações feitas pelos técnicos do Procase, o processo foi rapidamente bem-sucedido.

As aquisições dos animais se iniciaram no primeiro trimestre de 2015. No mesmo período, adquiriram equipamentos para suporte forrageiro: três silos cinchos, uma ensiladeira e uma enfardadeira, somando o valor de R$ 24.700,00.

Com investimento no valor de R$ 30.000,00, dois reprodutores da raça Dorper e oitenta ovelhas matrizes sem padrão e raça definidas foram adquiridos no segundo trimestre de 2016.

O Assentamento Nova Esperança São Domingos I foi beneficiado inicialmente com o aporte total de R$ 54.700,00. Cada associado foi contemplado com quatro animais, além de dois reprodutores para as dezesseis famílias. Após a entrega dos animais e equipamentos, também houve a contratação de assistência técnica visando o fortalecimento da associação.

Nesse sentido, começou o trabalho de repensar as estratégias de convivência com a seca e manejo. Houve capacitações, conversas e visitas individuais buscando gerar uma nova consciência no trato com os animais. Com a chegada do novo rebanho, praticamente dobrou o número de cabeças, aumentando a responsabilidade de cada família assentada.

O primeiro grande problema foi a resistência em adotar novas formas de criação e produção. As dezesseis famílias atendidas tinham um rebanho de, em média, cem animais e estavam habituados com a lida de forma tradicional, rústica. As cabeças soltas no pasto e sem condições de suplementação animal.

Acostumados a produzir dentro e para o núcleo familiar, foi preciso trabalho da assistência técnica para convencer muitas pessoas sobre as vantagens de compartilharem os equipamentos, adquiridos para todos os associados. Assim, a solução foi combinarem rodízios.

Além disso, o Projeto também promoveu intercâmbios, palestras, oficinas e capacitações para os associados/as. Os temas acordados coletivamente foram: “Produção de forragem e o uso do silo cincho”, “Manejo de Ovinos” e “Gestão da propriedade”. Com o intuito de ampliar a produtividade técnica e melhorar os indicadores socioeconômicos, garantindo a equidade e igualdade de gênero, incluiu-se também a capacitação: “Empoderamento da mulher no campo e nos espaços sociais”.

Como afirma um dos técnicos responsáveis pela Assessoria Técnica na região: “Vamos acentuar a questão de gênero. As mulheres que encabeçavam esta luta, mas os homens tinham a palavra final. Quando se falava de cabeça de animal, o homem chegava. Mas, na hora de discutir associativismo, sobrava a mulher” esclarece. Por isso, para além das formações voltadas ao dia a dia da atividade produtiva, questões de gênero também precisaram ser trabalhadas com o grupo.

Por fim, com os animais distribuídos e a realização das capacitações, criou-se o Fundo Rotativo. Foi reforçada em reunião com os beneficiários/as a necessidade de manter os animais até o fim do prazo estabelecido e cumprir a entrega das crias fêmeas ao fundo rotativo. Ficou acordado que os membros/as futuramente irão decidir em reunião o destino das matrizes – se serão vendidas, abatidas ou doadas em definitivo para os beneficiários/as. Vale ressaltar aqui que a posse dos animais cabe à associação; os beneficiários/as possuem apenas a concessão por prazo determinado.

Assim, com o projeto produtivo, buscou-se o melhoramento genético do rebanho de 16 famílias que praticam a agricultura familiar, como alternativa de renda. Em termos sociais, focou-se no protagonismo de mulheres e jovens entre 15 e 29 anos. Com isso, percebemos um aumento no número do rebanho, na qualidade das crias, no engajamento das mulheres no manejo dos animais e na integração de jovens via fundo rotativo.

 

O que mudou?

 

  • Com a entrega das máquinas para a produção de forragem, observou-se uma produção em torno de 4.400 quilos de forragem – que se encontra em estoque, já que os agricultores ainda aproveitam o pasto existente formado pelas últimas chuvas.
  • Hoje, há uma diversidade de plantas para o suporte forrageiro. Além do facheiro, os beneficiários podem contar com a maniçoba e o marmeleiro como fonte alimentar e nutricional.
  • Até o momento, já foram paridas 56 crias entre machos e fêmeas, aumentando o rebanho dos beneficiários(as). Dessas crias, até o momento já houve repasse de nove animais, consolidando a constituição do fundo rotativo, já previsto.
  • Segundo acordado pela comunidade, o fundo será composto entre jovens (masculino/ feminino), em um total de dezesseis beneficiários/as em idade inicial de 16 anos. Cada um/a receberá três animais, totalizando 48 animais repassados até março de 2019. Espera-se que esses jovens passem a integrar a associação, ocorrendo assim o que se buscava inicialmente: o protagonismo juvenil.
  • No projeto podemos observar o protagonismo feminino: dos dezesseis beneficiários/as diretos, apenas três são homens. A associação tem seus cargos de presidência, secretária e tesouraria ocupadas por mulheres.
  • Quanto a questões de gênero e o trabalho delas através da assistência técnica, a maior dificuldade encontrada foi a resistência dos homens envolvidos no projeto, onde ainda impera entre muitos a lógica de que a mulher não trabalha, ela apenas “ajuda” o seu companheiro. Seu trabalho doméstico não é contabilizado. É visto como obrigação por parte da esposa. A resistência por parte dos homens foi (está) sendo lentamente rompida com a insistência dos técnicos/as envolvidos e com a forte presença e ajuda da presidente da associação, Sara Maria Constância, mulher forte e determinada.
  • Incorporando os jovens às atividades e os incentivando à participação, o projeto contribui para a inserção social das minorias, adaptando às necessidades atuais a cultura específica da comunidade junto com a família de cada beneficiária/o assistida/o.
  • O envolvimento dos jovens em atividades produtivas e sua filiação à associação contribuem de maneira positiva para conter o êxodo rural.
  • A intervenção também altera gradativamente as relações em casa e dentro da comunidade. Geralmente, a figura do pai representa o responsável pela subsistência da família, o provedor dono do rebanho e das terras. Focando nos jovens, percebemos a criação e reforço dos laços com o rural, ao tempo que permite vislumbrar uma futura autonomia financeira.

Gerindo os recursos de forma a dar maior emancipação e condições financeiras aos jovens e mulheres, o Assentamento Nova Esperança São Domingos I inova ao proporcionar, sobretudo aos mais jovens da comunidade, condições para que desenvolvam suas atividades no campo, mostrando a estes/as que são dignos/as de confiança e capazes de gerir seu próprio empreendimento.

 

Quem faz a experiência?

Essa é a experiência da Associação de Cooperação Agrícola dos Produtores Rurais do Assentamento Nova Esperança São Domingos I (Acaprane), localizada no município de Cubati/PB.