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B Boas Práticas na Convivência com o Semiárido

Gestão das Águas
Canteiros econômicos e reuso de água cinza com filtro biológico
O que é

Integração é palavra-chave nas terras de Seu Aureliano e Dona Liduina. No Sítio Arueiras, onde vivem, compostagem, reuso de águas cinzas e canteiros econômicos funcionam de forma integrada e com base em princípios agroecológicos.

O canteiro econômico é uma tecnologia social que utiliza uma pequena quantidade de água para a produção de hortaliças – a principal diferença entre eles e os canteiros tradicionais é o volume de água que se utiliza para manter as produções.

Por sua vez, o sistema de reuso de água com filtro biológico tem o diferencial de utilizar minhocas para fazer o tratamento da água que vem da caixa de gordura, evitando mau cheiro, num processo orgânico de decomposição dos restos alimentares.

Com mais água para produzir e melhor qualidade do solo, a produção se fortaleceu, contribuindo para gerar renda fixa para a família.

Tanta boa prática reunida ampliou também a variedade do que produzem. No quintal é possível encontrar berinjela, couve, coentro, gergelim, cebola, pimentão, frutas e flores.

Municípios Atendidos




Experimentador
Aureliano Soares Martins e Liduina Leal Martins

Os agricultores Aureliano Soares Martins e Liduina Leal Martins moram no Sitio Arueiras, na zona Rural de Quixeramobim, no Território do Sertão Central, no Ceará.

Fale com o Experimentador

Aureliano Soares Martins e Maria Liduina Leal Martins
(88) 994-82-2813

Informações sobre a experiência

Também fora da lavoura o casal combina uma série de atividades.

Seu Aureliano é presidente da Associação de Feirantes de Quixeramobim, membro da Rede de Agricultores e Agricultoras Agroecológicos do Sertão Central e coordenador do Time de Futebol Esporte e Lazer da comunidade.

Dona Liduina é artesã – trabalha com biscuit e materiais reciclados – e cuida da rotina doméstica.

Aureliano e Liduina estão também em espaços de participação política, atuam em associações e outros grupos, articulam projetos para a região e participam de encontros de intercâmbio.

Isso permite que saberes e práticas agroecológicas adotadas pelo casal possam beneficiar outras famílias.

Persistência, disposição para ajudar e criatividade não faltam. “Até hoje eu não descobri o que eu não posso melhorar. Até um lajeiro você pode melhorar, pode produzir em cima de um lajeiro. É só ter coragem e fazer”, garante o experimentador.

Seu Aureliano é natural de Quixeramobim. Liduina é natural de Patos, distrito de Sobral, ambos no Ceará. O casal tem três filhos (dois homens e uma mulher).

Como funciona a experiência

É no composto orgânico que tudo tem início. O preparo feito por Seu Aureliano leva restos de frutas e verduras, além de galhos e folhas triturados para depois ser misturado com a terra. Ele ensina que, com a própria ação da natureza, depois de um ano, o composto fica pronto e já pode ser usado no lugar do esterco.

O composto é utilizado como adubo nos canteiros econômicos e no minhocário que faz parte do filtro biológico e compõe o sistema de reuso de águas cinzas – aquelas que vêm de pia, tanque e chuveiro. Filtradas, essas águas podem voltar a ser utilizadas na produção.

Seu Aureliano implementa também dois tipos de canteiros econômicos, tecnologia social que precisa de pouca quantidade de água para ajudar na produção de hortaliças. No primeiro modelo, são usados canos para fazer a irrigação. A ele dá-se o nome de canteiro econômico 1.

Vale dizer que os canos colocados no fundo do canteiro são em forma de “U”. É por esse cano, cheio de furinhos, que passa a água que vai ser distribuída de forma uniforme na lavoura.

O outro modelo é resultado da adaptação feita pelo agricultor. Batizada de canteiro econômico 2, essa versão não conta com a tubulação feita a partir do cano.

Nesse caso, a água é absorvida e distribuída por meio de uma lona, que leva uma camada de folha seca para maior absorção e fortalecimento do solo. “A lona não permite que a água vá para o solo, ela fica absorvida”, explica Seu Aureliano.

Atualmente, são cinco canteiros econômicos nas terras da família. Três do modelo 1; dois da segunda versão.

Seu Aureliano lembra que os canteiros econômicos são propícios para os períodos de estiagem. “Quando chove muito, não funciona, porque a água encharca a plantação e pode furar a lona. ”

Na propriedade de Seu Aureliano e Dona Liduina, as águas usadas na pia da cozinha e do banheiro, no banho e na lavagem de roupa têm destino certo: a caixa de gordura, por onde passam deixando os resíduos.

Pela tubulação, seguem o caminho para o filtro biológico. “No filtro quem faz o trabalho são as minhocas. Elas comem os restinhos de comida que ficaram”, explica Dona Liduina.

A filtragem da água no filtro biológico acontece em camadas:

1ª camada = húmus de minhoca
2ª camada = raspa de madeira
3ª camada = areia
4ª camada = brita
5ª camada = pedra grossa (seixo)
Por gravidade, a água que sai filtrada chega ao tanque de reuso.

A partir de um sistema de bombeamento elétrico, a água é direcionada à caixa d’água elevada, que é a caixa de distribuição. Também por gravidade a água filtrada alcança os plantios que estão no sistema de irrigação por gotejamento.

Importante: A divisão das tarefas entre a família é fundamental para o planejamento, desenvolvimento e manutenção das práticas que compõem a experiência.

Implementar

Compostagem

Há 10 anos o agricultor deixou o esterco de gado de lado e só utiliza o composto orgânico que produz. “Se tiver chovendo, em um ano e meio é possível ter o composto pronto. Mas, com pouca chuva, o tempo de preparo fica maior”, explica.

O preparo de Seu Aureliano teve início a partir da cobertura seca que se formava no terreno.

Para implementá-lo é simples. Veja só:

1º passo – reunir galhos, folhagens e restos dos cultivos.

2º passo – quebrar todos os galhos, tirar o grosso com o ancinho,
conhecido por ele como arrastelo, triturar as folhagens e os galhos.

3º passo – peneirar o material triturado e juntar com a terra, formando o composto.

Entre as dicas do experimentador, estão a de que a folhagem do juazeiro produz espuma em contato com a umidade – por isso, só pode ter de 20 a 30% dela no composto – e a de que não se deve usar folha de nim, pois esta planta é um inseticida natural.

São utilizados para o preparo do composto orgânicos restos das plantações de tomate, palhas dos coqueiros, folhagem da berinjela, restos de cenoura, capim, folhagem de jurema e jucá.

É debaixo da copa de um grande Juazeiro que a compostagem é feita. “Aqui é meu laboratório. Chego aqui para fazer meus experimentos”, conta o agricultor.

Canteiros econômicos

Parte do composto produzido por Seu Aureliano serve para fortalecer o solo dos canteiros econômicos, que dão aquela força e tanto na produção da família. Confira o passo a passo para implementar:

1° passo: cavar um buraco de 1 metro de largura com 20 a 35 centímetros de profundidade. O comprimento varia conforme a necessidade.

2° passo: nivelar o solo.

3° passo: forrar o canteiro com uma lona de 100 a 200 micras.

4º passo: cobrir a lona com cobertura seca (folhas e galhos secos e triturados).

5° passo: preparar um cano de PVC de 01 polegada medindo 6 metros, cortando meio metro de cada lado. Furar o cano com espaço de 30 centímetros entre os furos. Com a ajuda de dois joelhos de 01 polegada, encaixar as sobras do cano de um lado e do outro.

6° passo: colocar o cano no canteiro e despejar água nas duas entradas do cano para testar se a água se espalha por igual.

7° passo: cobrir o cano com telhas. Em seguida, cobrir tudo com terra. A terra tem que cobrir a lona por completo.

8º passo: Pronto! Agora é hora de adubar a terra com o composto orgânico!

O Canteiro Econômico 2, adaptado pelo agricultor, não usa o cano na base do canteiro, que é aguado com regador. Entra em cena a lona, que segura a água no cultivo.

Os materiais utilizados, para o canteiro econômico (tipo 1, que tem a tubulação por cano) foram:

– 6 metros de canos de PVC 50mm de 2 polegadas
– 6 metros de lona de 100 a 200 micas
– 6 metros de tela sombrite
– cobertura seca
– terra
– tela sombrite
– telhas coloniais

Para o canteiro do tipo 2 é tudo igual, só não se utiliza o cano. Vale ter cuidado redobrado com a lona, verificando se ela não está perfurada, e garantir que ela esteja totalmente coberta – checar sempre as bordas e colocar mais terra, quando necessário.

Lembre-se: é bom regar os canteiros a cada dois dias, mas é preciso monitorar a umidade da terra, para saber quando é preciso fazer uma nova aguação.

Aprendizados

Seu Aureliano gosta de compartilhar os aprendizados gerados. Eles podem ser úteis para outros experimentadores! Veja:

1. Cubra os canteiros com sombrite para evitar que o sol queime as plantas.

2. Cubra totalmente as bordas do canteiro com a lona, para que as hortaliças perto da borda não se queimem.

3. Faça o plantio combinado de hortaliças para garantir diversidade na produção.

Minhocário e filtro biológico

A outra parte do composto orgânico produzido é utilizada no minhocário que faz parte do filtro biológico usado no sistema de reuso de água cinza.

Para implementá-lo, vale lembrar de deixar o filtro coberto por um telhado, o que ajuda a garantir umidade e temperatura ideais para as minhocas, fundamentais no processo de filtragem.

“As minhocas são as minhas operárias. Cada dia que eu vou lá eu cuido delas, sabe por quê? Porque elas cuidam da minha água, das minhas plantas. Já tô vendendo o pacote do húmus, mostrando o meu produto no comércio”, conta Dona Liduina.

A recomendação de técnicos é de que que sejam usados no minhocário 50% de esterco de gado e 50% de compostagem de folhas nativas.

Mas Seu Aureliano e Dona Liduina optaram por fazer diferente. Eles utilizam 100% de compostagem e dizem que as minhocas estão bem adaptadas e se reproduzindo bastante.

Manutenção

“O cuidado é que a gente tem que sempre olhar o minhocário, deixar coberto, tudo limpinho ao redor, não deixar juntar formiga. Na parte da planta, tem que manter sempre umedecida. Todo dia tem que aguar, retirar as folhas secas, tem que olhar se não tem algum inseto”, recomenda Dona Liduina.

Outra dica é fazer uma revisão constante do sistema de gotejamento e corrigir os possíveis vazamentos.

A higienização não pode ficar de fora. São muitas as orientações de Liduina e Aureliano:

De oito em oito dias, é bom fazer a lavagem da caixa de gordura. A tela sombrite que fica na caixa de gordura pode ser lavada a cada dois dias.

Quinzenalmente, faça a limpeza do tanque de reuso e da caixa d’água elevada. Por fim, a cada cinco meses é indicado trocar a areia do tanque de filtragem.

Vale também manter o reservatório de água limpa sempre tampado e checar se não há entupimentos no sistema. Se tiver, é preciso desmontar o motor da bomba elétrica que faz o bombeamento da água filtrada para a caixa de distribuição e limpá-la, retirando a terra ou os resíduos que podem ficar nela. Depois, só colocar no lugar.

Recomenda-se fazer, a cada seis meses, a migração das minhocas que estão no filtro para o minhocário e colocar as que estavam no minhocário no filtro. No processo, retire o húmus produzido no minhocário e coloque o material orgânico para alimentá-las.

Para fazer a migração das minhocas, Seu Aureliano “pega uma tela sombrite, enche de compostagem em cima e coloca a tela na terra de baixo pra cima e puxa”.

Adiantou de quê?

Na família de Seu Aureliano, em cinco meses foram reutilizados 18mil litros de água, como registrado no hidrômetro que integra o sistema. Este número representa um reaproveitamento de quase 50% da água disponível.

Com isso, a produção aumentou e diversificou nas terras de Seu Aureliano e Dona Liduina.

O quintal produtivo, que recebe a água reutilizada, agora tem berinjela, couve, coentro, gergelim, cebola, pimentão, frutas e flores.

A água garantida e o uso dos canteiros econômicos estabilizou a produção e as feiras se tornaram fontes fixas de renda. Isso sem dizer da qualidade de vida e dos hábitos alimentares, que só melhoraram.

Além de economizarem água, com o sistema de reuso o casal tem produzido o húmus que utilizam na plantação e comercializam na feira agroecológica.

Esses avanços estão associados a uma maior participação política dos agricultores. Eles fazem parte de diversos grupos associativos e, assim, têm ajudado a conseguir projetos para a comunidade.

Desenrolar da História

Seu Aureliano já chegou a ter uma área de mais de 1000m2 com mais de 30 espécies de frutíferas e leguminosas. Isso foi antes da estiagem. Ele e Dona Liduina tinham uma horta-mandala com hortaliças, tomate cereja, beterraba, entre outras culturas.

Na época, a irrigação era feita com água do cacimbão e distribuída por meio de microaspersores.
Com a falta de chuva, o riacho Caraúna, que enchia a represa, secou e toda a plantação foi perdida.

Desde então, o abastecimento de água da família é possível graças ao carro pipa e ao armazenamento da água da chuva. A família conquistou a cisterna de primeira água, para consumo humano, e a de segunda água, para produção de alimentos.

Em 2013, foram contemplados com a tecnologia da cisterna de enxurrada, por meio do P1+2.

Foi a partir daí que Seu Aureliano pôde recomeçar os cultivos e começou a desenvolver a prática dos canteiros econômicos. O agricultor foi capacitado pela ASA e pelo IAC – Instituto Antônio Conselheiro e orientado a fazer dois canteiros econômicos.

Já naquela época a agroecologia fazia parte da vida do agricultor. Desde 1985 Seu Aureliano trabalha sem utilizar venenos e realizar queimadas.

Em fevereiro de 2015, por meio de uma parceria com o Fórum Cearense pela Vida no Semiárido (FCVSA), que reúne organizações como o IAC, a ASA e o Cetra – Centro de Estudos do Trabalho e de Assessoria ao Trabalhador, a família de Seu Aureliano e Dona Liduina recebeu o Sistema Bioágua Familiar.

“Aí o que era sonho virou realidade. É uma grande responsabilidade da gente porque depende do sistema da gente funcionar para outros agricultores poderem receber a tecnologia também”, ressalta o agricultor.

Apesar das práticas desenvolvidas por eles – canteiros econômicos e sistema de reuso de água – terem chegado à propriedade do casal por meio de meio de capacitações técnicas fornecidas por organizações não governamentais e programas federais com atuação no Semiárido nordestino, o olhar e a atuação dos agricultores fizeram e ainda fazem a diferença.

Foi observando o comportamento do meio ambiente que eles foram dialogando com os técnicos para sugerir mudanças no projeto inicial. “A natureza nos ensina muito, nós é que não sabe aprender com ela. Mas, eu tenho aprendido e muito com a nossa mãe natureza”, frisa Aureliano.

Vale ressaltar, também, que há 14 anos a família participa da Feira Agroecológica de Quixeramobim, onde comercializam hortaliças, tomate, cenoura, couve entre outras produções obtidas com os canteiros econômicos.

Quem apoia

Esta experiência conta com o apoio do Centro de Estudos do Trabalho e de Assessoria ao Trabalhador (CETRA) e do Instituto Antônio Conselheiro (IAC).

Contato:

Instituto Antônio Conselheiro (IAC)
(88) 3441-1824

http://www.iacceara.com.br

iac@iacceara.com.br

Centro de Estudos do Trabalho e de Assessoria
ao Trabalhador (CETRA)
(85) 3247-1659

http://www.cetra.org.br/

cetra1981@cetra.org.br