Criação de galinhas caipiras e horticultura na comunidade Jardim
O que é?
Apresentamos a experiência da Associação AMOR de Jardim, composta por cinquenta mulheres, onde 43 delas estão trabalhando para o fortalecimento da criação de galinhas caipiras, visando autonomia social e econômica.
Aqui, vamos ver a importância do processo de autoorganização das mulheres e o potencial da criação de galinha caipira, sob a visão sistêmica e agroecológica dos quintais produtivos.
Onde aconteceu?
A comunidade de Jardim se localiza no Território Vale do Sambito – que ocupa 3,2% da área do Piauí e abriga 114.688 habitantes –, município de Ipiranga do Piauí.
Como aconteceu?
A localidade é formada por 123 famílias que trabalham com agricultura familiar, desenvolvendo atividades como agricultura de subsistência de sequeiro, a criação de pequenos animais, galinha caipira e suínos para o autoconsumo e a geração de renda.
Com atuação nas comunidades de Jardim I, Jardim II e Mina, a Associação de Mulheres Organizadas de Jardim foi fundada em 2008, com o apoio do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR) de Ipiranga.
A partir de então, a Associação se organizou na busca por projetos, ações e apoios que trouxessem a melhoria da qualidade de vida da comunidade.
Como implementar?
Reunião entre os moradores da comunidade
As dificuldades eram muitas, como a falta de água, de luz, de atendimento médico, de comunicação, de transporte para a sede do município. Tanto as moradias como a segurança alimentar e nutricional estavam precárias.
Por isso, inicialmente, elas lutaram para que fosse colocado um telefone público na localidade. Em seguida, perceberam que poderiam se ajudar mutuamente, passando a realizar leilões, festas, bingos e rifas, arrecadando recursos para contribuir na gestão da associação, na realização de atividades locais e no apoio às demandas da população.
Um exemplo dessas ações foi o sorteio de cestas básicas a partir da contribuição das próprias integrantes com um quilo de alimento. Com a realização desses bingos, elas arrecadaram recursos suficientes pagar a escritura da sua terra.
Em 2015 elas tomaram conhecimento a respeito do Projeto Viva o Semiárido (PVSA), durante as reuniões do Conselho Municipal de Desenvolvimento Sustentável, e decidiram lutar para que o projeto investisse na comunidade.
Em 2017, conseguiram ter sua proposta de Projeto de Inclusão Produtiva (PIP) aprovada pelo PVSA, e por meio desse projeto puderam, então, investir no fortalecimento da criação de galinhas caipiras na busca por melhoria da qualidade de vida de suas famílias e da comunidade. A iniciativa vem crescendo e, hoje, inclui quintais agroecológicos produtivos, contribuindo para a autonomia das mulheres envolvidas.
Esse processo contribuiu para o fortalecimento das mulheres da Associação, visto que elas estavam desanimadas, após uma série de projetos que não haviam se efetivado.
Com os novos investimentos, vieram novas conquistas.
O objetivo da PVSA no local, foi promover a inclusão produtiva das mulheres para geração de renda e melhoria da organização social e da qualidade de vida, por meio da qualificação da criação de galinhas caipira, contando com um recurso total de R$ 247.000,00.
O investimento previa assessoria técnica para a implantação e pós-implantação do PIP, e apoio ao aprimoramento das práticas de manejo e das condições de infraestrutura. Isso incluiu a construção de aviários em todas as unidades produtivas, e o cercamento dos quintais.
A alegria delas por ter um aviário em seu quintal, é expressa por uma beneficiária durante uma oficina: “Hoje até as galinhas têm casa de telha. Parece casa de rico”.
Ainda, para tornar essa ação viável, foi necessário considerar a dificuldade de acesso à água na comunidade, demandando a construção de uma cisterna calçadão de 52 mil litros e de um poço, além da compra de equipamentos produtivos: forrageira, chocadeira, balança, pluviômetro, comedouros e bebedouros. A instalação de uma placa de identificação do projeto foi realizada, bem como a aquisição de um kit de informática.
As mulheres envolvidas no projeto possuem a média de doze matrizes de galinha e um galo por família, em um total de 550 matrizes e 43 galos. Com o objetivo de garantir alimento para as galinhas, o projeto providenciou a plantação de sorgo granífero e aquisição de 215 sacos de milho. Foi prevista também a estruturação de uma horta coletiva irrigada.
Quanto à gestão do projeto, foi estabelecido um processo participativo com a composição de equipes de trabalho, cada uma contando com três integrantes: uma de licitação e compras, uma de fiscalização (da qualidade do material, construção da obra e equipamentos e dos serviços), uma de comercialização e uma coordenação.
Três elementos foram centrais no processo de implementação e execução das ações do projeto das mulheres da AMOR Jardim, começando pelo associativismo, que visa o fortalecimento para melhoria da qualidade de vida da comunidade. Ao mesmo tempo em que o processo de auto-organização das mulheres busca a transformação das relações desiguais de gênero, e foca na autonomia econômica através da geração de renda.
O que mudou?
Com a organização e protagonismo das mulheres, somados aos investimentos do PVSA no local, foi possível identificar uma série de mudanças na comunidade, vejamos algumas:
- Quanto ao associativismo, podemos ver que as reuniões para a construção e defesa do projeto contribuíram para o fortalecimento da associação. Antes, esses encontros aconteciam com menor frequência e com pouca participação das integrantes.
- Com a construção dos aviários das unidades produtivas, identificamos a melhoria do manejo e gestão dos quintais produtivos.
- O projeto que inicialmente tinha como foco a avicultura, vem se ampliando de forma agroecológica para a implantação de quintais produtivos, integrando essa criação à produção de hortaliças, de frutas, a plantação de forrageiras, dentre outras.
- Hoje a produção busca maior autonomia, para que haja menor compra de insumos externos, como por exemplo, para alimentação das galinhas caipiras, proporcionando um ganho econômico.
- Depois do Projeto, as mulheres passaram a se envolver mais na gestão, comercialização e controle das ações, contribuindo para que elas se apropriassem dos processos e se responsabilizassem pela sua plena realização. Por outro lado, como limitante, temos a falta de recursos para os constantes deslocamentos necessários das integrantes até a sede do município.
- Olhando para a auto-organização das mulheres e para as mudanças nas relações de gênero, consideramos que – por ser a associação um espaço específico de mulheres – elas se sentem à vontade para compartilhar vivências, dificuldades, medos, como também resistências e aprendizados. Percebem-se revigoradas como mulheres e como integrantes da associação e da comunidade.
- Algumas delas também tem participado de atividades fora da comunidade, em espaços de representação, como sindicatos, conselhos e os comitês do PVSA/URGP4, consolidando ações de solidariedade e trabalho coletivo.
- Contudo, as mulheres seguem sentindo dificuldades em relação às questões de gênero. Manifestações de machismo na comunidade frequentemente as colocam em situações constrangedoras em espaços de participação mista. Consideram-se restringidas quando não são ouvidas e não têm suas opiniões consideradas, assim como pela pressão da sobrecarga dos trabalhos doméstico e de cuidados com a família.
- Quanto à geração de renda e autonomia econômica, vemos a grande potencialidade da Associação e de suas integrantes, apontada pela duplicação do número de animais.
A experiência da AMOR Jardim nos mostra a importância dos espaços de auto-organização das mulheres, e como eles se constituem como lugares de fortalecimento da solidariedade, de troca de experiências, e de aprendizado coletivo.
Enquanto trabalham em prol da melhoria de vida de toda a comunidade, elas buscam reconhecimento do seu trabalho e da sua contribuição econômica como sujeitas.
Vemos ainda como o associativismo e a organização coletiva são estratégicos para atrair projetos e ações que venham a beneficiar as comunidades, ao mesmo tempo que estabelecer parceiras se mostra fundamental para dar força e suporte ao desenvolvimento rural sustentável e solidário.
Quem faz a experiência?
Essa experiência vem sendo realizada pela Associação de Mulheres Organizadas de Jardim, no município de Ipiranga do Piauí/PI.