[gtranslate]

B Boas Práticas na Convivência com o Semiárido

Organização Comunitária
Fruticultura irrigada

 

Produção em fruticultura através de irrigação na região do Vale do São Bento/CE.

 

O que é?

Essa experiência tem como protagonistas os/as agricultores/as familiares, que desenvolvem atividades da cadeia da fruticultura irrigada com cultivos de cajá, caju, manga, goiaba, acerola, graviola, maracujá, sapoti, dentre outras.

Nessa área geográfica habitam em torno de 1.300 famílias, distribuídas em dezessete comunidades. Essa experiência de agroindustrialização e comercialização de frutas complementa a formalização de uma cadeia produtiva da agricultura irrigada, que surgiu no final dos anos de 1980 com a produção de horticultura e fruticultura no Vale, estado do Ceará.

 

Onde aconteceu?

A experiência acontece no Semiárido cearense, no município de Quixeramobim, no Vale do Rio Forquilha, mais precisamente na Associação dos Produtores do Vale do São Bento.

 

Como aconteceu?

Em 1987, um grupo de agricultores cria a Associação dos Produtores do Vale do São Bento, cujo lema, “Neste vale ninguém passará mais fome e nem será humilhado”, consiste em uma resposta aos acontecimentos ocorridos em períodos de seca, que tornava o contingente populacional do Vale do Forquilha cada vez mais pobre pela escassez de água e alimento.

No percurso dessas inquietações sociais surgem novas e necessárias parcerias, dentre elas o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) , a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Ceará (Ematerce), o Banco do Nordeste e a Secretaria da Agricultura.

 

Como implementar?

Vamos conhecer mais do caminho trilhado por essa comunidade, e como o estabelecimento de parcerias fez toda a diferença no desenvolvimento de suas atividades produtivas.

Em meio a esses apoiadores e parceiros, em 1989, outra parceria leva a uma proposta de perfuração de poços tubulares, também conhecidos como poços aluvionares. Um time de geólogos, agrônomos, antropólogos e outros pesquisadores da Universidade de Tours, na França, com o apoio do poder local e da Universidade Estadual do Ceará, incentivam e apoiam essa tecnologia social e sustentável com a finalidade do abastecimento humano.

Sendo a vazão dos poços bem maior que a esperada, foi possível desenvolver um sistema de irrigação para beneficiar a produção então voltada para a subsistência. Trata-se de um sistema de irrigação por microaspersão e gotejamento, em que a água é acrescida de fertilizantes (fertirrigação), limitando os riscos de contaminação das águas subterrâneas pelos insumos químicos. Ele foi batizado de Projeto Pingo D’Água.

No Vale do Forquilha, inicialmente, apenas 21 famílias agricultoras acreditaram que seria possível produzir frutas para além do consumo por meio dessa tecnologia. Comprometido por uma grande enchente em 2004, logo em 2005 o projeto retoma suas atividades e, com o apoio do PSJ, é instalado um novo sistema de irrigação que deu o padrão inicial do projeto Pingo D’Água. As 21 famílias de agricultores retornam a plantar, produzindo três vezes mais o que produziam no início.

No ano de 2012 a Associação passa a produzir e comercializar para o Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Fundam nesse ano a Cooperativa dos Agricultores Familiares do Vale do Forquilha (Coopvale), forma jurídica de agregação que elimina a impossibilidade de lucro, imposta pelo estatuto da associação.

“Quando nós vimos a possibilidade de perdermos a venda de nossos produtos porque não estávamos organizados, foi que buscamos formar uma cooperativa, que é a Coopvale”, afirma Deusimar Cândido, presidente da Associação.

Agricultores e também outras associações aderem, visando organizar a produção e assegurar a comercialização das frutas in natura. Essa movimentação, que busca recursos por meio do Projeto São José III (PSJ III) para incrementar a produção, é fruto de uma discussão dos movimentos sociais a partir do final de 2014 a início de 2015. Em 2015, a Associação dos Produtores do Vale do São Bento (APVSB) inicia por conta própria a agroindustrialização (beneficiamento e processamento) da fruta em polpa.

Objetivando a agregação de valor, finaliza o prejuízo no cultivo de frutas, principalmente no período de safra. Nasce a marca Frutos do sertão. Novamente, surge o PSJ III produtivo, em 2017, dessa vez fortalecendo as etapas de agroindustrialização e comercialização com um investimento total de R$ 427.331,50 e contrapartida financeira de R$ 8.260,47.

Baú refrigerado que melhorou a comercialização da comunidade.

 

Novos recursos que fazem a diferença.

Esse investimento possibilitou a construção da agroindústria de frutas, inserção de maquinários, câmara de resfriamento e transporte adequado com câmara de resfriamento. A assessoria técnica pôde ser fortalecida por um ano, oferecendo capacitações em cooperativismo, associativismo, gestão e organização, entre outras. Elaboram ainda, com empresa específica, o Plano de Negócio reforçando o Arranjo Produtivo Local. Apoiam, assim, a associação/cooperativa na perspectiva futura de se trabalhar em redes de cooperativas.

Atualmente, trinta famílias associadas à Vale do São Bento fazem parte da Coopvale. As demais associações circunvizinhas somam um total de 62 famílias cooperadas. Nos últimos seis anos, devido à estiagem, a produção de frutas da Associação dos Produtores do Vale do São Bento diminuiu.

Com isso, vários produtores da região se integraram ao sistema de arranjo produtivo local. Comercializando sua produção através da Coopvale, também dela se beneficiaram. Com o incremento no projeto de agroindustrialização, houve maior volume de produção e comercialização da cooperativa. Consequentemente, o raio de atendimento para a venda de seus produtos veio a se ampliar, ultrapassando o limite municipal de sua área geográfica.

 

O que mudou?

Com todas essas ações, a comunidade alcançou grandes avanços tanto no volume e qualidade da produção, como na renda das famílias, vejamos algumas:

  • A princípio, a cooperativa atendia algumas escolas da rede pública de ensino do município de Quixeramobim. Depois do incremento à sua Agroindústria, atende, além de todas as escolas da rede pública de ensino do município de Quixeramobim, também as de vários outros municípios a grandes distâncias da área da agroindústria. São estes: Parambu, Aiuaba, Arneiroz, Catarina, Tauá, Quiterianópolis e Acopiara.
  • Na totalidade, a Coopvale fornece fruta beneficiada e processada a cinquenta escolas, aos supermercados e lanchonetes de Quixeramobim. As polpas solicitadas pelas escolas são aquelas de frutas que dão alto rendimento em suco: cajá, caju, acerola, goiaba e a manga. Já as polpas nobres provêm de graviola, maracujá e sapoti; mais caras, são produzidas para os supermercados e lanchonetes, armazenadas em câmara fria e comercializadas fora da época.
  • Desde o começo se registra um esforço e a crença nas possibilidades de melhorias. Onde tudo começou com a produção de frutas – início da cadeia da fruticultura irrigada – passou pela agroindustrialização e comercialização, e agora convive com perspectivas futuras de redes de cooperativas.
  • Boa parte das famílias não associadas do Vale do Forquilha também se beneficiam desse processo de produção, pois a Coopvale compra frutas in natura que antes eram desperdiçadas e hoje são industrializadas. O melhor exemplo é o do produtor local que atualmente fatura 20 mil reais por semestre sobre a manga, que antes da agroindústria da polpa, era uma das frutas mais desperdiçadas.
  • Os cargos e funções ocupados nesse processo de produção, distribuição, agroindustrialização e comercialização das frutas e polpas são ocupados pelas famílias que fazem parte da APVSB Associação e da Coopvale. Mesmo sendo associadas, elas prestam serviços e são remuneradas por suas atividades prestadas. Os pesadores e distribuidores trabalham por diária, pesam as frutas e polpas e separam por escola, fazendo, em seguida, as distribuições.
  • A agroindústria de beneficiamento e processamento da fruta em polpa apresenta a participação massiva de jovens e mulheres. Para além, tem como coordenadora uma jovem filha de uma família associada/cooperada, formada em tecnologia de alimentos. Há também uma jovem que trata da contabilidade e um jovem que trabalha com o sistema de controle público do E-parceria, isso garante o engajamento da comunidade no Projeto e a sustentabilidade dessas ações.
  • O PSJ III, ao investir no desenvolvimento rural sustentável da Associação do Vale do São Bento, contribuiu para que os agricultores/as familiares pudessem desenvolver o fortalecimento da produção agrícola com sustentabilidade.
  • Os beneficiários/as também tiveram acesso a novas tecnologias, capacitação e aprimoramento na gestão. A consequência disso, foi além da melhoria da qualidade de vida: assegurou a permanência das famílias em seu lugar de origem.
  • Com a ampliação da produção, a Coopvale começa a sentir a necessidade de um maior incremento da agroindustrialização e comercialização, a fim de resolver questões inerentes ao seu crescimento. Pois o aumento da produção começou a comprometer a qualidade do produto (durabilidade das polpas). O espaço físico da agroindústria já se tornara limitado, dificultando a logística e, por extensão, a gestão. Expandir se torna necessário para que a Coopvale possa prestar um serviço de qualidade às escolas públicas e a alguns supermercados de Quixeramobim, seus compradores, favorecendo um maior incremento à sua renda.
  • Graças à Agroindústria financiada com o apoio do PSJ III, a Coopvale – incluindo a Associação dos produtores do Vale do São Bento – expandiu sua produção. Fortaleceu a capacidade de produção e acessou novos mercados, ultrapassando fronteiras e comercializando seus produtos, inclusive para outros municípios do Sertão Central e do Sertão dos Inhamuns, do estado do Ceará.
  • Traduzindo os resultados em termos quantitativos, observamos um resultado quase dobrado nos últimos anos. A renda bruta da Associação pela venda da polpa de fruta às escolas entre os meses de abril de 2017 a março de 2018 totaliza R$ 1.023.579,38. Continuaram a crescer com o incremento do projeto através da agroindústria da polpa de fruta, e é possível observar que a renda bruta no primeiro semestre de 2018 chegou a R$ 938.392,23, quase o mesmo valor que alcançavam antes em um ano de trabalho.

A Associação dos Produtores do Vale do São Bento/Coopvale é um exemplo de que o investimento de políticas públicas, direcionadas e com foco, permitem que mesmo as comunidades localizadas nos grotões do Semiárido nordestino podem conviver com o estigma da seca.

É possível encontrar alternativas para sua permanência em suas comunidades com dignidade e crescimento econômico, por meio da produção local e desenvolvimento do cooperativismo que assegura renda e segurança alimentar e nutricional.

 

Quem faz a experiência?

Essa é a experiência da Associação dos Produtores do Vale do São Bento, no município de Quixeramobim/CE.