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B Boas Práticas na Convivência com o Semiárido

Produção Agroecológica
Gastroquinta

Através do Gastroquinta jovens rurais fortalecem a sua relação com o meio rural, resgatam antigas receitas e valorizam a agricultura familiar.

 

O que é?

A alimentação saudável e regional, segurança alimentar e nutricional,  juventude rural, equidade de gênero e gastronomia são temas que permeiam Intercâmbios realizados pelo Programa Semear Internacional (PSI).

Nessa experiência específica, o destaque será para a gastronomia, que se tornou ainda mais rica ao entrar em consonância e complementaridade com os quintais produtivos. Essa feliz união deu origem ao termo Gastroquinta!

Entendendo a importância de envolver os jovens como aliados/as em suas diversas ações, o que inclui a melhoria nutricional e segurança alimentar das famílias, o FIDA vem adotando estratégias participativas e contemporâneas para responder aos entusiasmos da juventude voltados à produção e distribuição de alimentos. Assim, a gastronomia é tida como uma alternativa de empoderamento e (re)aproximação da terra e de promoção da produção agroecológica.

 

Onde aconteceu?

Essa experiência surge a partir das ações do Intercâmbio em Ecogastronomia para Jovens rurais do Semiárido, que ocorreu em 2018 no estado de Sergipe, organizado pelo projeto Dom Távora, no âmbito das ações do FIDA/Semear Internacional e do Slow Food Brasil, e se multiplica entre vários/as jovens que integram projetos apoiados pelo FIDA no nordeste do Brasil.  

 

Como aconteceu?

O ato de cozinhar nos traz reflexões sobre a origem do alimento, resgata práticas culinárias familiares, exalta a importância do cuidar da terra e reconhece o importante papel do produtor e da produtora rural.

Nesse sentido, a gastronomia no campo se posiciona como um ato de resiliência à padronização e à colonização dos alimentos, elevando o entendimento de que cozinhar é um ato agrário e comer é um ato político.

Fruto de intercâmbios, formações e outras iniciativas voltadas à juventude, à produção de alimentos e à gastronomia, surge a experiência da “Gastroquinta: Comida do quintal para a mesa”, que se define pela nova forma de cozinhar no campo, onde os autores são particularmente jovens rurais, sem formação acadêmica na área da gastronomia ou nutrição, mas possuem um diploma de conhecimentos tradicionais da comida do campo. Isso faz deles mestres da culinária rural intitulados pelas convivências com a diversidade local, principais elementos para render um prato autêntico e exclusivo no mundo da ecogastronomia.

 

Como implementar?

Vamos conhecer um pouco de como se deu a criação desse termo e o desenvolvimento dessas experiências que unem gastronomia e quintais produtivos.

Em 2018 foi realizado o I intercâmbio em Ecogastronomia, na região do baixo São Francisco, em Sergipe, nos moldes dos princípios do Movimento Internacional Slow Food (SFI). O evento contou com 30 jovens rurais do semiárido, beneficiários dos projetos apoiados pelo FIDA. Os resultados foram a criação de um grupo forte de jovens que se comunicam e compartilham experiências até hoje e, ainda, uma publicação sobre o intercâmbio, com as receitas desenvolvidas e testadas pelos jovens com o apoio de renomados chefs brasileiros.

No ano seguinte, foi realizado o II Encontro de Jovens Rurais do Semiárido Brasileiro, em Picos, no Piauí, que reuniu 500 pessoas, dentre as quais 355 jovens nordestinos. O tema do evento foi “Os novos desafios da sucessão rural para a juventude do semiárido brasileiro”.

Esses eventos, além de proporcionarem capacitações temáticas, assistência técnica, intercâmbios, ampliação e inovação nos sistemas produtivos tradicionais e alternativos, também imprimem uma característica única aos projetos apoiados pelo FIDA no semiárido do Nordeste do Brasil. Notadamente, é crescente a participação dos jovens do campo junto aos projetos e eventos realizados pelo PSI, fenômeno que gera novas demandas e missões, particularmente para as atividades voltadas ao beneficiamento e comercialização da produção local.

Dentro das ações do FIDA, também é uma das preocupações e eixos norteadores, o papel da nutrição na segurança alimentar. Por isso, foi desenvolvido o Plano de Ação para Nutrição (NAP) 2019-2025, que busca acelerar a integração da nutrição nos investimentos para famílias vulneráveis em áreas rurais, incluindo mulheres, crianças, jovens e povos indígenas, visando melhorar a qualidade da dieta e promover uma alimentação diversificada das populações rurais beneficiárias.

O FIDA entende que o empoderamento de jovens e mulheres sobre a nutrição, por meio da ampliação de seus conhecimentos e práticas educativas, pode reduzir a desnutrição por uma geração inteira, e a gastronomia no campo contribui significativamente para esses resultados serem alcançados.

E quando nos referimos à gastronomia no campo, os ingredientes não são bens gastronômicos mas um patrimônio da população rural. Nesse sentido, o palco da gastronomia é um quintal produtivo, o fogão a lenha, as panelas de barro e os utensílios locais, que consolidam um conjunto de práticas tradicionais no qual a culinária se inspira nas memórias e heranças familiares.

Partindo dessa premissa, a gastronomia no campo se apresenta como um vetor de promoção e valorização da agrobiodiversidade local, cujos ingredientes são fornecidos por cada sazonalidade e características dos biomas ou ecossistemas. Essas características formam um receituário diversificado e próprio de cada região, produzindo comida de verdade no prato, que nos ensina a origem e a história de cada alimento.

Algumas das receitas feitas pelos jovens que participaram do Intercâmbio em Ecogastronomia.

 

Uma nova experiência em ecogastronomia, a Gastroquinta.

A Ecogastronomia é um conceito que permeia toda a filosofia do movimento Slow Food, que há 30 anos tem como missão promover a educação alimentar e do gosto, a luta pela conservação e uso sustentável dos produtos da agrobiodiversidade e a valorização da agricultura familiar.

Levantando a bandeira do alimento “bom, limpo, justo e acessível para todos”, o movimento afirma a convicção de que alimentar-se é o direito primário da humanidade, para garantir a vida não apenas do gênero humano, mas de todo o planeta. A Ecogastronomia também é uma referência para a Aliança dos Cozinheiros Slow Food, projeto lançado para construir as bases de uma aliança solidária com os agricultores familiares, promovendo a produção local, mediante a comercialização e ações em suas cozinhas.

Dentro disso surge a Gastroquinta. Os projetos dos quintais produtivos no semiárido foram o grande incentivo para solidificar as iniciativas locais.

A Gastroquinta se qualifica pela produção de alimentos característicos do meio rural, utilizando essencialmente a produção livre de agrotóxicos dos quintais produtivos na elaboração de receitas, mesclando conhecimentos tradicionais com técnicas e práticas culinárias, fazendo de cada experiência um momento de aprendizado coletivo e transmissão para outros jovens.

Cozinhar com produtos dos quintais já é uma prática das famílias, porém o que marca essa experiência pioneira, foi ter como palco o próprio quintal, sim o quintal também pode virar cozinha, promovendo a conexão entre todos os elementos que o caracterizam na formulação das receitas e reunindo aprendizes e apreciadoras/apreciadores em volta do fogão a lenha.

Esses jovens colocam em prática os valores passados pelas mães e avós, proporcionado uma perfeita harmonia e relação entre a produção local, os hábitos alimentares sustentáveis e a terra – princípios da Gastroquinta.

Vamos conhecer uma dessas receitas e colocar a mão na massa?

Suco de palma com laranja e limão

Ingredientes:

400 g de palma;

1 limão verde;

3 laranjas de quintal grandes;

350 ml de água;

melaço de cana a gosto

 

Modo de fazer:

Retire os espinhos da palma, lave e corte-as em cubos. Coloque a palma no liquidificador, adicione o sumo do limão, as laranjas e bata por 5 minutos. Coe o suco e coloque-o de volta no liquidificador, adicionando a água e o melaço. Bata novamente por 2 minutos. Sirva gelado.

 

 

O que mudou?

Após o Intercâmbio em Ecogastronomia para Jovens rurais do Semiárido, houve a continuidade do interesse dos jovens pela gastronomia e a busca de hábitos saudáveis em suas escolhas alimentares. Os resultados identificados mostram o fortalecimento dos sistemas alimentares sustentáveis através do ato de escolher ou promover alimentos locais, contribuindo para a segurança alimentar e nutricional.

Vejamos algumas dessas mudanças:

  • Nos últimos anos, o interesse e a participação dos jovens rurais em temas transversais à segurança alimentar e nutricional é crescente e a produção de alimentos tem sido uma ferramenta de empoderamento nas mãos deles/as.
  • O intercâmbio promoveu trocas de experiências entre as associações e cooperativas, nos seus processos de produção e comercialização para a formação de rede.
  • A Ecogastronomia foi enriquecedora, pois abriu o olhar para a ampliação do uso de frutas e plantas comestíveis que muitos/as jovens não sabiam que poderiam usar na alimentação. Assim, houve uma mudança de hábitos alimentares pessoais e também na comunidade de origem dos/as jovens. Como afirma Aparecida Silva, PVSA do Piauí: “O intercâmbio para mim foi um grande privilégio, pois pude passar para as mulheres da associação comunitária toda a importância da Ecogastronomia e o uso dos ingredientes locais”.
  • Com essa nova experiência, alguns jovens também tiveram ganho de renda, trabalhando com o fornecimento de refeições e alimentos. Com essa tendência, as iniciativas voltadas à geração de trabalho e renda para os jovens rurais podem contemplar tanto as atividades agrícolas quanto as não agrícolas, como o turismo rural, a ecogastronomia, hospitalidade, restauração, entre outras ofertas no campo, que possam fortalecer os empreendimentos coletivos.
  • Houve uma valorização dos produtos da agricultura familiar em detrimento dos produtos industrializados, o que beneficia os produtores de uma maneira geral. Como afirma Vandielson Silva, do Projeto Pró Semiárido/BA: “Foi muito importante a participação dos jovens no curso de Ecogastronomia (…) Se cada jovem começar a buscar e trazer de volta uma receita tradicional, somente uma receita, cada um, quantas receitas que se perderam, com o tempo, não seriam trazidas de volta a nossa mesa, valorizando um produto local?”.
  • A experiência do intercâmbio revelou ao jovem que uma receita tradicional não representa apenas sabores e memórias afetivas, nela se imprimem as relações sociais, hereditárias de uma família, a diversidade agrícola e o respeito ao homem do campo, que busca resistir a chegada cada vez maior dos produtos industrializados à mesa da população rural.
  • As experiências também revelaram que quanto mais os/as jovens rurais conhecem a realidade e potencial do campo mais reforçam a sua identidade, empoderando-se por meio do conhecimento e desenvolvendo autonomia nas suas iniciativas.

 

Além das mudanças já citadas, o Gastroquinta também proporcionou  a valorização dos saberes dos mais velhos, o resgate de antigas receitas e a fortalecimento da relação dos jovens com o meio rural. Por meio dessa experiência, abriram-se novos caminhos e novas perspectivas para as comunidades rurais, que podem se usar da experiência para novas possibilidades de geração de trabalho e renda.

 

Quem faz a experiência?

A Gastroquinta é uma experiência desenvolvida pelos projetos apoiados pelo FIDA no Brasil.